“Quando eu vim pra esse mundo, eu não atinava em nada. Hoje eu sou Gabriela, Gabriela he! Meus camaradas.” Os versos de Modinha para Gabriela, de Dorival Caymmi e eternizados pela obra de Jorge Amado, traduzem a essência de Ilhéus: uma cidade profundamente enraizada em sua história e tradições, resistente às mudanças bruscas e sempre atenta às suas próprias características. É nesse cenário que, em janeiro de 2025, uma nova gestão assumirá o comando do município, cercada de dúvidas e expectativas sobre sua capacidade de entender e lidar com a complexa realidade local que é extensa e exigirão muitos esforços para alguns dos vários problemas existentes sejam minimamente solucionados, afinal , não vivemos no mundo fantástico, muito menos em uma cidade fantástica, ela trás problemas crônicos e de décadas.
Rumores indicam que o futuro governo será formado por “especialistas” vindos de fora, muitos deles diretamente participantes da campanha eleitoral e os outros que compõem quadro de consultoria e assessoria com agentes políticos da capital. Essa configuração já levanta questionamentos. Ilhéus tem um histórico de exclusão de modelos de gestão que não dialogam com sua cultura e tradições. A memória da única administração que não concluiu o mandato, composta por muitos vindos de Minas Gerais, ainda serve como exemplo dos riscos de importância de um estilo de governança que não se conecta à realidade da cidade.
O desafio vai além da técnica de administração. A gestão precisará de interesses articulados em um ambiente político marcado pelo “toma lá, dá cá” e pelas alianças enraizadas na cidade que teve como base na sua formação o coronelismo. A pergunta que ecoa é: especialistas externos, com pouca ou nenhuma experiência local, têm habilidade para navegar neste terreno? A pressão pela renovação encontra resistência nas práticas consolidadas e a busca pelo equilíbrio entre tradição e inovação será essencial para evitar conflitos entre o Executivo e o Legislativo. Se o futuro prefeito falhar em mediar essa relação, corre o risco de reviver os erros de dentro de casa.Tomara a Deus, que não ocorra isso. Nesse jogo não se avalia bem querer se executam os interesses e as disputas.
Ilhéus é a terra de Gabriela, que “nasceu assim e cresceu assim”. Sua identidade não se molda facilmente a ideias revolucionárias ou gestos que ignoram suas particularidades. Como escreveu Jorge Amado, “viver já é difícil; conviver, então, é um desafio permanente”. Para o próximo governo, essa convivência será o maior teste e apenas quem entender as raízes profundas da cidade poderá aspirar a conduzi-la sem perder o rumo. Afinal, Ilhéus sempre cobra caro daqueles que ousam desrespeitar seu jeito de ser.
Artigo assinado e de responsabilidade de Emenson Silva.